A Câmara dos Deputados aprovou um projeto de lei que visa aumentar a pena para o crime de injúria racial quando cometido contra mulheres e idosos. A proposta agora segue para análise do Senado, e, se aprovada, poderá representar uma mudança significativa na legislação brasileira no enfrentamento a estes crimes.
Atualmente, a legislação prevê pena de reclusão de 2 a 5 anos, além de multa, para quem comete injúria racial — ofender a dignidade ou o decoro de alguém em razão de cor, etnia ou procedência nacional, conforme estabelecido pela Lei 14.532/23.
A novidade do projeto aprovado é o aumento dessa pena de 1/3 a 2/3 quando o crime for praticado contra idosos ou mulheres, o que pode elevar a punição máxima para até 8 anos e 3 meses de prisão. Além disso, se o crime for cometido em grupo, a pena pode ser ampliada em até metade, conforme decisão do juiz.
Segundo o advogado especialista em Direito Público e Criminal, Sandro Câmara, é importante esclarecer que a Lei 14.532 de 2023 já equiparou o crime de injúria racial ao racismo, aumentando a pena e tornando-o imprescritível e inafiançável. Entretanto, o aumento da pena não é um indicativo para a redução do crime.
“O aumento de penas, por si só, muitas vezes não é suficiente para reduzir estes crimes, pois estudos indicam que a severidade da punição não necessariamente impede que o crime seja cometido”, explica.
Ainda segundo o especialista, embora o endurecimento da pena tenha um efeito simbólico importante e ajude na conscientização, a efetividade prática é limitada. “Há uma carência de informações sobre o perfil dos autores e motivações, além das dificuldades que as polícias enfrentam para elucidar esses crimes”.
De acordo com Sandro, no caso de crimes contra mulheres, por exemplo, o aumento de penas não necessariamente ajuda a combater a violência, mas pode contribuir para conscientizar a sociedade sobre o problema.
Estatísticas
Dados recentes reforçam a complexidade do cenário. Uma pesquisa conduzida pela Faculdade Baiana de Direito, em parceria com o portal Jusbrasil e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), revelou que, apesar de a legislação classificar o racismo como crime inafiançável com pena de até cinco anos, na prática, muitos condenados têm as penas revertidas em medidas menos severas.
O estudo analisou julgamentos de crimes raciais contra pessoas negras em redes sociais e constatou que houve maior frequência de aplicação de penas privativas de liberdade para os condenados por injúria (25%) do que por discriminação (11,11%). Contudo, de 54 condenações analisadas, 49 tiveram regime aberto, três regime semiaberto e nenhum réu foi condenado a pena em regime fechado.
Também é importante ressaltar o recente crescimento de denúncias. No ano de 2024, o Disque 100 registrou 5,2 mil violações de racismo e injúria racial, um aumento expressivo em relação aos anos anteriores.
Dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) também revelam que o número de processos judiciais por injúria racial cresceu 610% entre 2020 e 2023, saltando de 675 para 4.798 registros.
Apesar das dificuldades na aplicação das penas mais severas, casos emblemáticos começam a marcar a justiça brasileira. Um deles é o de Day McCarthy, condenada a 8 anos e 9 meses de prisão em regime fechado por racismo e injúria racial contra a filha de Bruno Gagliasso e Giovanna Ewbank, considerado o maior exemplo de condenação por injúria racial na história do país.
Para Sandro o aumento de penas tem um valor simbólico, especialmente ao reconhecer a vulnerabilidade de grupos como mulheres e idosos. “Para que haja uma redução real na criminalidade é fundamental investir também em melhorias na investigação, na educação e em políticas públicas preventivas”, finaliza.
Fonte: ES Hoje